Artigos da Seção AMAN 72

MERDE

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    1902 agitou o panorama presente e avante: a gravação do primeiro disco de Enrico Caruso, o lançamento, pela Casa Edison, do primeiro suplemento de discos gravados no Brasil, os nascimentos de Moreira da Silva, Clementina de Jesus, Bide, Marçal e Alberto Ribeiro. Acrescentem a inauguração do bondinho aéreo do Pão de Açúcar e a posse de Rodrigues Alves na presidência da República, atribuindo plenos poderes ao prefeito do Distrito Federal, engenheiro Pereira Passos, para transformar a cidade do Rio de Janeiro na Paris tropical. Basta? Como nem tudo é carnaval, o já então metido à besta Fluminense Futebol Clube foi fundado em 21 de julho daquele ano. Argh!

    Fugindo de retiro semissabático, encarei a adesão do imã Ivo Salvany ao zapzap72. 2016 não poderia ter melhor começo. Damerran Smith, o Magnânimo, irrompeu da Aldeota para oxigenar o aplicativo armado da inquietude existencial, da espontaneidade, da originalidade, e sejamos francos, da porralouquice divinal típica dos profetas e sonhadores como ele sempre foi desde a infância, onde barbarizava nas aulas de catecismo em questionamentos irrespondíveis a piedosa professorinha. Consta a seu desfavor, em biografia não autorizada, flerte ligeiro com a Infantaria, na escolha de Arma, o que se consumado seria dos equívocos mais colossais da humanidade, comparável à preferência dele por abominável clubinho da Gávea atestando que nem xamãs superiores atingem a perfeição neste mundo imperfeito.    

   Mas, zapeando durante a siesta, quase despenquei da rede - “Salvany. Manda esse médico à merda”. Ops, algum desaforado resolveu esculhambar a sensaboria dominante, imaginei.  Remetente? Wilson Pedreira??? Escândalo total!!! Céus ... Pedreira, o afável comunicante, consultor metafísico apreciado pelas mensagens sapienciais a ímpios e pecadores? Custei a acreditar, mas as pegadas virtuais eram irrefutáveis, mesmo a um analfabeto digital como eu – Mr Quarry reagira tal qual bárbaro cavalariano diante de algo muito grave para mandar às favas proverbial gentileza. O que seria? A leitura retroativa de mensagens logo implodiria o mistério.

    Em tom confessional, Salvany revelara ter superado sete dos dez anos de sobrevida a ele profetizados por um doutorzinho fajuto. Compreendi a indignação do Pedreira, ou melhor, acho até que ele pegou leve. Donde o pajezinho de araque teria arregimentado tamanha ousadia para fixar prazo de validade terrena ao fero, imortal tanquista do Real Engenho? Exaltado, logo extraí da memória a figura de Carlos Cachaça, grande compositor popular, um dos fundadores do GRES Mangueira.

   Nascido no Buraco Quente do morro, em três de agosto de 1902 – ô aninho importante – Carlos Moreira de Castro celebrizou-se Carlos Cachaça pelo talento e indiscutida predileção etílica, o que não o impediu de trabalhar quarenta anos na Rede Ferroviária Federal sem uma falta sequer ao expediente. Santa caninha. Tem mais. Até passar desta para melhor – será? - aos noventa e sete, em 16 de agosto de 1999, manteve-se lúcido e ativo, zombando dos médicos que lhe anteviram existência bem mais curta devido à bendita cachacinha dos seus amores.

    Onde você estiver, mui honrado cavaleiro andante da bela figura Ivo Damerran Smith - nas manhãs ensolaradas de Iracema curtindo o herdeiro dinástico Arturzinho, ou no balançante Pirata - lembre-se de Carlos Cachaça, o mangueirense ilustre que dinamitou prognósticos pretensiosos para partir quase centenário.

   Quanto ao Pedreira, replico a sua indignação furibunda sem arremesso à la merde. Muito pelo contrário. Reza lenda que lá nos oitocentos, ao se emporcalharem de fezes as entradas dos teatros franceses, expelidas pelos cavalos de charretes e carruagens, os atores rejubilavam de alegria pela presença de público, e a partir daí desejar merda ao companheiro passou a ser sinônimo de sucesso no palco. Por extensão, de sorte e felicidade na vida.

    Vida longa ao estimado guru, irmão cósmico Salvany.

    Merde a todos os meus amigos, em 2016.         

Rio de Janeiro, 06 de janeiro de 2016.

Dom Obá III, da Comédie Française{jcomments on}.