Artigos da Seção AMAN 72

SERÁ O ARUBINHA?

Comente este artigo!

Submit to FacebookSubmit to Google PlusSubmit to TwitterSubmit to LinkedIn

SERÁ O ARUBINHA?

No tempo que Dondon jogava no Andaraí

Nossa vida era mais simples de viver

Não tinha tanto miserê, nem tinha tanto tititi

No tempo que Dondon jogava no Andaraí.

                                                   (Nei Lopes)

    Desapegados de carioquices nem desconfiam que o Dondon existiu e atuou como zagueiro no finado Andarahy Athletic Club, time da Fábrica de Tecidos Confiança sediado onde hoje funciona o Shopping Iguatemi, na Rua Barão de São Francisco, em Vila Isabel. Chamava-se Antônio de Paula Filho, porte elegante, dançarino exímio, que a improvável posteridade de novela global e o samba de Nei Lopes tornaram símbolo de um Rio mítico.

   Muito antes do Dondon, todavia, outro jogador do Andaraí, seu contemporâneo, ascendeu ao estrelato: o ponta-esquerda Arubinha, autor de famosa praga ainda a inquietar  pesquisadores isentos  e torcedores apaixonados.

    É inconteste o Vasco x Andaraí na noite chuvosa da quarta-feira, 29 de dezembro de 1937, com 12x0 para um Cruzmaltino desfalcado de jogadores feridos em acidente envolvendo caminhão da Prefeitura e veículo que os transportavam ao estádio do Fluminense.  Decadente, apesar do vice-campeonato em 1934, o Andaraí enfrentava o campeão de 1936, protagonista recente da reunificação do futebol carioca no célebre Clássico da Paz - Vasco x América. Antevia-se, portanto, a fácil vitória vascaína. Por que, afinal, a relevância do confronto no folclore do futebol?        

   Idos pós-goleada, o Vasco sem ganhar título, reverberava a história de o Arubinha ter enterrado um sapo em São Januário praguejando doze anos de jejum vitorioso ao clube. Quanto mais tempo corria, mais aumentava a notoriedade e o temor da suposta praga, só desfeita nove anos depois, em 1945, com o lendário Expresso da Vitória marcado pela contratação dos três patetas ao Madureira - Lelé, Isaías e Chico.

  Em 1947, o episódio conquistaria contornos fantásticos na crônica A Praga do Arubinha, incluída no livro O Negro no Futebol Brasileiro, de Mário Filho, à época escritor e jornalista esportivo consagrado, dono do Jornal dos Sports. Durante décadas, soberana, a versão do irmão mais velho de Nelson Rodrigues repercutiu até que bisbilhoteiros de registros oficiais a questionassem.

    Na súmula, o jogo começou no horário previsto, 21:15h, desmentindo o anunciado fair-play do Andaraí em aguardar a recomposição do Vasco devido ao acidente de trânsito. Na verdade, os questionamentos atingem o próprio Arubinha, ausente da partida conforme a mencionada súmula. Lenha na fogueira: existira a praga de fato ou destrambelharam as asas da imaginação narrativa? E se o personagem tivesse saído do banco de reservas, no final da goleada, ajoelhado e encharcado pela chuva pesada para proclamar no centro do campo a terrível imprecação: - " Se existir Deus no Céu e justiça na Terra, o Vasco passará doze anos sem ser Campeão". 

   Mangas arregaçadas em alfarrábios se pinçam evidências parcialmente válidas, tanto a evidências históricas quanto à versão de Mário Filho, ainda que sem a glamourização da crônica. Sob a manchete O Vasco e a praga de Arubinha – Ficará doze anos sem ser campeão – Notas - cerca de mês e meio transcorrido da goleada na então Rua Guanabara, em 18 de fevereiro de 1938 O Radical publicou:   

   “... A PRAGA NO VASCO ... A seguir, comenta-se a fraca performance do Vasco, nestas últimas partidas. Arubinha olha para o lado três vezes, e pondera – É praga. O Vasco, sem dó nem piedade surrou-nos. Não joguei, mas fiz a minha reza. O Vasco ficará 12 annos sem ser campeão. O Botafogo sabe quanto pesa um “trabalho”, pois em 1910 “sapecou” o Mangueira de 24x0 e a praga pegou - Mais algumas palavras e o nosso amigo Arubinha deixou a redacção”.

     Ao revelar-se ausente da partida, Arubinha desfaz parte do mito, sem desacreditá-lo de todo.      

   E o tenebroso sapo de boca costurada, ele o enterrou no gramado de São Januário? Pelo visto, este pormenor reforçou elementos ficcionais – quem conta um conto aumenta um ponto - usados por Mário Filho para valorizar relato de episódio tornado referência de mau agouro quando o Vasco jejua de títulos. Para agnósticos tipo  yo no creo en brujas, pero que las hay,las hay, a praga só veio a se consumar, na íntegra, durante o período 1958-1970 recidivo em 2003-2015.     

   Na atual fase vexatória do Gigante da Colina, antenados com o passado perguntam: Será o Arubinha?

    Sem desmerecer o Sobrenatural da Barreira do Vasco, reputo a crise a sucessivas administrações desastrosas, bem mais prejudiciais ao Clube do que o Arubinha e sua mandinga simplória. Mas aí é outra história.    

Direto da Rua General Almério de Moura, São Cristóvão, 12 de setembro de 2015.alt

Dom Obá III, a pedido do Sr Bonner Jacaré, desafiado agora a elaborar texto de lavra pessoal sobre o Fla-Flu da Lagoa.{jcomments on}