Artigos da Seção AMAN 72

Passagem de Chefia do Gen Silva e Luna - Despedidas

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     A despedida, mesmo esperada, sempre nos pega desprevenidos. Este é um momento de emoção que eu gostaria de adiar. Após mais de 45 anos de marcha, com a mochila nas costas - nem sempre de passo certo, mas sempre com o bumbo no pé direito - faço um “auto-horário” para receber o comando de “fora de forma”. Saio de forma por decurso de prazo.Não saio por término de missão. Tenho consciência de que muito ainda estar por fazer. Saio por razões próprias da legislação militar. Saio sem ter conquistado essa cortejada sensação do dever cumprido. Mas saio agradecido, sereno e confiante por entregar a Chefia do EME em mãos melhor preparadas que as minhas, para conduzir o ODG da Força nesses tempos desafiadores. Que os olhares se voltem para o Gen Adhemar, meu amigo e companheiro de tantas jornadas, a quem antecipo votos de pleno êxito no honroso cargo. Que Deus continue a iluminá-lo, meu Amigo, juntamente com a querida família!

  Sabe-se que, por orientação do nosso Comandante, além do que já lhe impõe a missão, o EME deve ser, de fato, o ODG do Exército. Nesse sentido, o EME deve ser bússola, fonte normativa e coordenadora; deve enxergar longe, selecionar frentes e regular curto; deve trabalhar com projetos; deve tornar a SIPLEX uma sistemática ainda mais eficaz de planejamento; deve firmar contratos de objetivo com os ODS; deve produzir menos papel e mais resultado; deve trabalhar como um EM, derrubando muros e abrindo portas; deve travar as batalhas diárias do orçamento; deve mediar as questões onde as percepções divirjam; deve ser o guardião das Normas; deve propor uma nova concepção estratégica para o Exército; deve avançar na direção de uma nova Doutrina; deve apresentar novas formas de racionalização e valorização dos nossos Recursos Humanos e de governança de TI; e deve colocar, gradualmente, a Força na Era do Conhecimento. Enfim, deve transformar o Exército. E deve fazer tudo isso, usando, principalmente, o braço forte da Alta-Administração; e a mão amiga de toda a estrutura da Força. Palavras-chave: negociação, entendimento, cooperação, convergência de esforços e muita, muita determinação.Comandante, a missão não está concluída, mas está a caminho. Cheguei ao fim sem ter atingido a meta. Ao Gen Adhemar caberá descontar as últimas promissórias dessa dívida. “Fuerza, Viejo!”

    O Estado-Maior do Exército é o Estado-Maior do Comandante do Exército. Pela natureza de sua missão, reúne atividades variadas, complexas e sensíveis, todas com consequências duradoras para a Força. Lida com a Alta-Administração do Exército - clientes exigentes, com conhecimento de causa e débito de paciência. Lida com problemas que ainda não existem e com outros que já escalaram todos os degraus da solução e ainda estão por resolver. Lida com excepcionalidades conferidas somente ao poder discricionário do Comandante, exigindo um alinhamento diário, com aquela autoridade.

   Ao EME cabe dar conformidade e consequência a todas as ordens, sugestões e pedidos que recebe, para assim permitir que o Exército continue transitando com desenvoltura pela alma da Nação. 

   Sou o 65o Chefe do EME, desde o Marechal CANTUÁRIA, a passar o cargo.

    Então, vamos às despedidas! Desculpem-me, mas não encontrei outro modo - a partir de agora, passo a ser o sujeito da oração principal. Numa despedida é difícil escapar dessa armadilha. Foram mais de 45 anos de vida castrense - de Cadete a General de Exército. Nunca considerei esse período como uma carreira militar, mas como uma vida de Soldado. Em 1969, incorporei-me ao Exército, hoje, ele está incorporando a mim. Soldado é o que sei ser. Pretendo continuar sempre pronto e à disposição da Pátria – se ela precisar “empregar a Reserva”.

   Aprendi que “nós somos da Pátria a guarda, fiéis soldados por ela amados”. Percebi, depois, que a Pátria que me ensinaram a amar ainda não é uma realidade, mas continua sendo uma esperança. Manterei as mangas arregaçadas. Minha fé permanecerá jovem. Continuarei indo dormir ouvindo toques de alvorada.  

    Percebi que devagar passam os dias - os anos passam depressa. Os 45, passados na caserna, voaram. Ainda me vejo “paisano”, “bisonho”, “voador”, com uma mala de “arataca” na mão, cruzando os portões da AMAN - cheio de apreensões e expectativas.

    Nessa jornada, dois entes me escravizaram: meus familiares e meus subordinados. Sempre tive medo de decepcioná-los. Desse medo retirei energias para superar muitas dificuldades.

    Em todos os postos e cargos que ocupei, procurei servir - sem me servi deles. Nunca. Nos meus exames de consciência, ao final de cada dia, sempre me fiz a corajosa pergunta de Gabriela Mistral : “serviste hoje?”

    No ACE, vivi tensas e intensas emoções. Nas Reuniões Administrativas, dei voz à razão, procurei colocar meu PC fora do TO, defendendo os interesses da Instituição, segundo minha percepção. Nas Reuniões de promoção, dei voz à emoção, procurei colocar meu PC dentro do TO, pronto para morrer junto com os meus subordinados.

   Nas batalhas de cada dia, entre Clausewitz e Basil Liddell Hart, procurei seguir Sun Tzu.

  Usei o uniforme com orgulho, sentindo que ele me emprestava um espécie de elegância moral.


  Bem, em homenagem à concisão, penso que já é althora de começar a dizer muito obrigado - do fundo do coração - por terem me ajudado a chegar até aqui com a mesma impulsão e entusiasmo do Cadete 556. Obrigado por terem sido compreensão, apoio, sugestão, proteção, incentivo, entusiasmo, exemplo, força, trabalho, amizade, alegria, família, vibração e fé. 

  Agradeço o convívio enriquecedor e fraterno, e o apoio inconteste recebidos dos integrantes do Ministério da Defesa – nomino o Gen De Nardi e o Dr. Ari; e das duas Forças coirmãs – nomino os atuais Ch EM (foram vários) Ten Brig Pohlmann e Alte Esq Carlos Augusto. O trabalho conjunto que desenvolvemos e os princípios éticos que nortearam nosso caminhar concederam-me motivação permanente, fortaleza interior e diuturna alegria. Destaco, nominalmente, o Sr Ministro Celso Amorim pelas demonstrações de apreço com que sempre me distinguiu. E, particularmente, por ter, recentemente, me convidado para integrar a Alta Administração da Secretaria Geral do Ministério da Defesa, tão logo passe para a reserva. Obrigado, Sr. Ministro, pela confiança! Sem transigir com meus princípios, hipotecarei o melhor das minhas energias no sentido de reforçar sua briosa Equipe.

  Agradeço aos Órgãos de Direção Setorial, aos Comando Militares de Área, aos Órgãos de Assistência Direta e Imediata do Comandante do Exército, pela convergência de esforços, permanente e imprescindível apoio e fraterna amizade. Agradeço aos integrantes do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e das Funções Essenciais à Justiça que responderam sempre de maneira construtiva nossas demandas institucionais. Agradeço à FHE/Poupex pelo apoio aos nossos eventos.

  Aos meus pais, que não tiveram oportunidade de participar da minha vida militar, meu preito de gratidão. Convivemos pouco, mas sei que eles sempre rezaram por mim. Deles, herdei a força que vem da necessidade. E sou-lhes profundamente grato por isso. Se pudesse escolher nascer de novo, nasceria novamente em sua casa.

  À família que constitui (esposa, filhos e netos – patrimônio que o Exército me permitiu edificar), obrigado por terem entendido essa exigente servidão de Soldado a que me impus, apoiando-me em tudo, sem reservas de compreensão.

  Ao meu Comandante, Gen Enzo - o mesmo há 18 anos, quase consecutivos - que sempre me homenageou com sua irrestrita confiança e inconteste amizade, agradeço, reafirmando que não desembarcarei aqui. É certo que trabalhamos muito e conversamos pouco sobre nós mesmos nesse lapso de 18 anos. Mas sabemos que sempre houve uma lealdade superlativa, uma contundente franqueza e uma grande identidade de coração. Muito obrigado, Comandante!

    À família militar, aqui representada pelos presentes, agradeço, sentindo-me bem-aventurado, por ter sido adotado como membro desse grande lar, nessa

longa e magnífica jornada. E peço que me preservem no seu seio.

   Ao EME, é mais difícil o agradecimento e a despedida. Nele vivi o intenso período, ainda em curso, de transformação do Exército. Foram três anos fora da zona de conforto, sem óculos de visão noturna, sem receita de bolo, e que nos impuseram muita resiliência. Isto exigiu, de mim e da minha Equipe, ousadia, aliada à imaginação – abrir-se para o novo, jogando o rascunho fora. Com a compreensão e o apoio de todos, particularmente da Alta Administração do Exército, nos foi possível transformar resistências em adesões e, posteriormente, em mudanças. alt

    Nesses três anos, construímos, no EME, um time imbatível, coeso, determinado, disciplinado e capaz de enfrentar e vencer desafios. Tornamo-nos, também, um grupo de amigos. Sabemos mais uns dos outros. Estamos mais juntos. Somos mais solidários. E se o principal objetivo de uma missão é unir as pessoas, esse nós alcançamos.

   Sabemos que a fartura costuma ser má conselheira, mas a dificuldade une. No EME, juntos, superamos muitos desafios. E é exatamente por isso que se torna complicado, agora, dizer “até breve”. Digamos então que nada se perderá, pelo menos de dentro de nós. E que seguiremos nossos caminhos certos de que - sendo filhos de um mesmo Pai - um dia voltaremos a nos reunir em sua Casa para fazermos um brinde à transformação do nosso Exército. Vocês são um bando de irmãos. Muito obrigado a cada um e a todos (do Gen Peixoto a Da. Maria).

   A Deus, agradeço por acordar mais cedo, todos os dias, para ouvir minhas orações - e por manter sua mão invisível me guiando desde o internato do Colégio Agrícola até o dia de  hoje.

   Por fim, agradeço a todos que nos homenageiam com suas honrosas presenças.

   Permanecerei morando em Brasília com as portas do coração e da residência aberta aos amigos.

   Muito obrigado a todos por tudo. 


 

Brasília, 10 de abril de 2014.


General de Exército JOAQUIM SILVA E LUNA

Chefe do Estado Maior do Exército{jcomments on}