Causos Militares relatados pelo Cel Eng Refm Adélio Cunha CHIBINSKI

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OS ASPIRANTES DE ENGENHARIA/72 CHEGAM AO 9º BECmb

Dos cinquenta e cinco Aspirantes de Engenharia da Turma Marechal Mascarenhas de Moraes, seis foram classificados no 9º BECmb (Aquidauana-MT), o Batalhão Carlos Camisão. Todos nos apresentamos prontos para o serviço em fevereiro de 1973: Chibinski, Dário, Wagenfuhr, Bianchini, Vita e Amêndola.

Para se ter ideia da falta de oficiais na Unidade à época, respondia pelo comando da Cia C Sv o Cap Veterinário (Ch da Granja, que estava sendo desativada), que me passou o comando da subunidade, pois o Cmt Cia efetivo se encontrava em férias; fui Cmt Pel Pnt/Cia C Sv, cargo que exerci por pouco tempo, pois logo assumi a Cia, e depois passei a integrar o E M Btl, tendo a oportunidade de, já 1º Ten, ser o S/3 (com vencimentos de major !).

Tenho boas recordações daqueles tempos.

Quanta esperança de um batalhão inteiro depositada no sangue novo chegado da Academia, que juntado ao sangue dos poucos Cmt Pel já existentes, todos R/2, iria “revolucionar” a instrução da Unidade! Até Instrução Especial, nos moldes da SIEsp/AMAN, passou a ser ministrada.

De tenente a capitão, fui transferido e retornei ao 9º BECmb por duas vezes, tendo servido com todos os comandantes, de 1.973 a 1.984; outros companheiros de turma, com os quais tive o privilégio de ombrear, chegaram nesse período: Pécora, Peres, Mourão e Barros. Vários oficiais de turma subsequentes também chegaram, muito contribuindo para aumentar a operacionalidade do histórico batalhão, cuja 1ª Cia foi a primeira tropa da FEB a entrar em combate em solo europeu.

Sempre volto à Aquidauana, pois lá me casei. Para muitos militares do meu tempo, que lá ainda estão, continuo sendo tenente. Não é raro, nessas ocasiões, alguém, ao me cumprimentar efusivamente, perguntar:

- e a Esboslávia, Ten Chibinski?

Foto mandada fazer pelo Cmt Btl, para registrar o período do seu Cmdo

Oficiais do 9º BECmb em 1976

 

Incorporação 1976 – Ten Dário (Rspn S Cmt Btl) apresenta a tropa ao Ten Chibinski (Rspn Cmt Btl). À retaguarda, o Ten Wagenfuhr.

 

Cel Chibinski comandando o grupamento de ex-integrantes do 9º BECmb, em evento de julho de 2018

 

A CONSTRUÇÃO DO CAMPO DE POUSO PARA O DESTACAMENTO DE CARACOL

No começo do ano de 1974, servia eu no 9º BECmb, de Aquidauana, no então Estado de Mato Grosso, quando a Unidade recebeu do Cmt 4ª DC, de Campo Grande, a missão de construir um campo de pouso no Destacamento de Fronteira Caracol, pertencente ao 10º RC, de Bela Vista.

A localidade de Caracol situa-se no sudoeste do estado, próximo à fronteira com o Paraguai, definida pelo Rio Apa, nas proximidades do qual, em território paraguaio, também existia, à época, uma localidade, com um destacamento militar.

Na área reinava a boa vizinhança, com circulação de brasileiros e paraguaios nacionais em ambos os sentidos, inclusive de militares.

Sem projeto de engenharia, o valioso C 5 – 34, Vade Mecum de Engenharia, nos bastou para fazermos o projeto expedito do campo de pouso, após os reconhecimentos necessários.

O Destacamento de Construção de Caracol, valor pelotão, do qual fui o segundo Cmt, foi passado em reforço ao 10º RC, durando na ação por seis meses, até entregar o campo de pouso em condições de uso por pequenas aeronaves.

Enquanto durou a obra, alguns fatos pitorescos aconteceram.

 

HAVIA UM BANCO DE TRATOR SOBRE A LAMA

Os trabalhos iam a todo vapor, quando, num fim de tarde, torrencial chuva teve início.

O operador de um trator Caterpillar D-4, que fazia uma das valas de drenagem do campo, deixou, inadvertidamente, o equipamento dentro da cava, retornando à base, por ordem do sargento chefe de equipe. A chuva prosseguiu pela noite e por todo o dia seguinte, não havendo condições de retorno ao trabalho.

Como o terreno era em declive, a enxurrada de água e terra da terraplenagem cobriu o trator, ficando somente o banco à vista. Aconteceu então que, no terceiro dia, logo após a chuva ter parado, o Cmt 4ª DC, que visitava o 10 º RC, sobrevoou o canteiro de obras.

Logo depois, chegou pelo rádio mensagem alertando que o general havia visto um banco de trator abandonado no canteiro de obras.

Que eu saiba, aquela autoridade nunca ficou sabendo que abaixo daquele assento havia um baita Cat D-4.

 

A PÁ-CARREGADEIRA ENGOLIDA PELO OLHO-DE-BOI

Os militares da obra, certamente apoiados pelos cavalarianos, de imediato “reconheceram a área” e logo passaram a gozar da amizade e do apreço das pessoas.

Certa sexta-feira, ao se encerrarem as atividades, o sargento encarregado da manutenção dos Eqp Eng autorizou que um soldado operador de pá-carregadeira fosse até uma fazenda, distante cerca de 5 Km, buscar o cabrito que havia ganhado; e lá foi o militar pilotando a sua Cat 930, percorrendo bom trecho através campo, para encurtar caminho. Acontece que o lençol freático estava à flor da superfície e na região havia enormes “olhos-de-boi”, que são buracos cheios água e argila, verdadeira areia movediça, onde qualquer veículo atolado mais afunda, na medida em que se tente retirá-lo depressa.

Pois foi dentro de um enorme olho-de-boi que ficou a pá-carregadeira, em tal situação, que se podia mexer nas alavancas de controle estando de cócoras ao lado do equipamento, segundo relatou o soldado, ao retornar a pé, ao anoitecer, com o cabrito nas costas.

O mesmo sargento, experiente, orientou que se deixasse a máquina no local, pois na manhã seguinte ela sairia “por si só” do atoleiro; dito e feito: pela manhã o “olho-de-boi” havia drenado e a Cat 930, se remexendo aos comandos do operador, saiu facilmente da enrascada. Naquele mesmo dia, houve churrasco no almoço.

 

PRATICANDO “RELAÇÕES INTERNACIONAIS”

Mais para o final do período em que estive naquela missão, chegou ao destacamento um senhor, idoso e de semblante nitidamente paraguaio, que, se dirigindo ao Sgt Cav Cmt Dst Caracol, perguntou:

- é “por acá” que trabalha um tal de cabo Azambuja (nome fictício), vindo lá das bandas de Aquidauana ?

O sargento disse que iria verificar, mas, precavido, perguntou o motivo da procura pelo militar, ao que obteve, como resposta:

- quero conhecer a pessoa que está querendo casar com minha neta, que mora do lado de lá da fronteira!

Ao tomar conhecimento, e sabedor do estado civil da pessoa procurada, autorizei o sargento a dizer ao visitante que o referido cabo já havia retornado para a sede do batalhão, o que providenciei de imediato, para evitar prováveis males futuros à família daquele militar, excelente profissional, hoje de saudosa memória.


NO TRECHO DA CONSTRUÇÃO DA BR-262

Quando seis Asp Eng da Tu MMM chegamos ao 9º BECmb, no alvorecer do ano de 1.973, o aquartelamento tinha poucas áreas calçadas. O Cmt Btl defendia a ideia de que o militar tem que pisar na terra, pois é sobre ela que vai combater.

Pois bem, quando o novo comandante assumiu, logo na primeira reunião de oficiais, dentre muitas diretrizes, uma foi bem enfatizada: “Vamos calçar este batalhão e plantar mais árvores!”. De imediato foi montada uma “Fábrica de Bloquetes” nos fundos da OM. Cada Cmt Cia passou a ter “liberdade de manobra” em sua área de responsabilidade; houve até um companheiro de turma que criou uma campanha para angariar mudas de árvores e sacos de cimento, por conta da qual muitos soldados gozaram bons dias de dispensa. As palmeiras-imperiais ainda hoje existentes em frente ao batalhão são daquela época. Eu mesmo registrei, por exemplo, em vários QTS: “instrução deixada de ministrar, por ordem do Cmt Btl; o Pel foi empregado em missão de transporte de pedra para pavimentação do quartel”.

Areia e brita se conseguia com facilidade. Pedra havia muita na Serra de Camisão, distrito do município. O grande problema era a quantidade de cimento necessária, que chegava aos milhares de sacos, para alimentar a betoneira da “fábrica”.

A BR-262 estava sendo implantada, no trecho Miranda-Corumbá, pela CER-3, sediada em Jardim. O Chefe daquela Comissão de Estradas de Rodagem ia com certa frequência ao Btl; numa dessas oportunidades, soube eu depois, teria dito ao Cmt Btl que estava precisando de um oficial para chefiar, temporariamente, o escritório administrativo que acabara de instalar em Corumbá, já que a sua ideia de manobra era construir a rodovia com duas frentes de trabalho, avançando nos dois sentidos do trecho.

Alguns dias depois, o S Cmt me informou que eu passaria à disposição da CER-3, para chefiar o Escritório de Corumbá, devendo, antes, ir à Jardim, para receber instruções. Durei uns três meses na missão; depois de mim outros também tiveram a mesma oportunidade.

Vários vagões, adentrando pelo ramal da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil (NOB), tiveram a carga de cimento descarregada no Btl. A fábrica de bloquetes produziu muito, chegando ao ponto de “exportar”, por ordem superior, para Campo Grande, onde havia áreas militares a pavimentar.

Ainda nos dias de hoje, quando vou a Aquidauana e visito o Btl Carlos Camisão, vendo-o todo calçado, lembro com saudade daqueles bons tempos; instruções tiveram de ser recuperadas, mas o Cmt Btl estava certo. Tenho também boas recordações das viagens noturnas, em vagão leito do famoso trem Bauru - Corumbá, aos domingos (ida) e às sextas-feiras, quando vinha passar o fim de semana em casa, a cada quinze dias; aliás, foi numa dessas ocasiões que minha mulher, Loraine, perguntou-me, com a inocência de recém-casada com militar:

- se você não é da CER-3, por que te mandaram trabalhar em Corumbá?

Surpreso com a lógica da pergunta, disse a ela o que me veio à mente:

- é porque a fábrica de bloquetes do batalhão tem que funcionar!

De novo, outra pergunta, com a mesma lógica feminina:

- então, você está sendo trocado por sacos de cimento ?

Procurei desconversar…. veja bem, não é bem assim....

 

 PRESTANDO AJUDA HUMANITÁRIA

Lá pelos idos de 1.976, estava eu, 1º Ten, no comando da Cia C Sv/9º BECmb, quando o subtenente me procurou, dizendo que um dos soldados estava muito aflito, porque a mãe dele, prestes a dar à luz, se encontrava em casa, no distrito de Piraputanga, sem assistência nenhuma e sem condições de vir à cidade.

Tínhamos de agir rápido; disse eu ao “Sub”:

- coloque colchão, travesseiros e lençóis numa pick-up (no caso, uma “pata choca”), e vá resgatar a mulher, levando-a para a emergência do Hospital da Cidade (nome como é conhecido até hoje), e leve também o filho dela e um enfermeiro da Formação Sanitária!

Como incentivo, disse-lhe também, brincando, mas pensando sério, que se preparasse para atuar como “parteiro”.

Umas três horas depois, ao ver a mesma viatura estacionada próximo à Subtenência da Cia, adentrei na reserva de material e perguntei ao subtenente como havia sido a empreitada, ao que ele, apontando para um colchão no chão, todo manchado, me disse :

- a criança nasceu no caminho, se encontra no hospital, todos passam bem, estou muito cansado, mas feliz, e ganhei mais um afilhado!

Eu não disse nada; apenas o abracei e saí rápido, indo despachar com o S Cmt Btl, que, vendo meu estado emocional, perguntou se algo anormal havia acontecido; respondi-lhe:

- ao contrário, major, tudo normal; a família Btl Carlos Camisão ganhou mais um integrante”.

E contei-lhe o ocorrido.

 

 VOLTANDO AO MEU ESTADO, O PARANÁ

Após ter concluído a ECEME, me apresentei no QG da 5ª RM/5ªDE no início de 1.989, e assumi cargo na Seção de Serviço Militar (SSMR-5), como adjunto e, pouco tempo depois, como chefe.

Além de operacionalizar o SERMIL, tínhamos também o Serviço de Identificação Regional (SIR-5) e os Tiros de Guerra (TG) do Paraná e de Santa Catarina sob nossa responsabilidade.

 Quartel-General da 5ª RM – 5ª DE (Curitiba-PR)

 

O EXÉRCITO COMO FATOR DE COESÃO FAMILIAR

Certa feita fui visitar o 13º BIB (Ponta Grossa-PR), por ocasião da seleção complementar, que acontece antes da incorporação de recrutas.

Andando pelo quartel com o Cmt Btl, perguntei-lhe sobre os preparativos para a solenidade de incorporação; à guisa de resposta, contou-me ele que recebera, no dia anterior, um casal, pais de um conscrito que estava prestes a ser incluído no excesso de contingente; continuou me dizendo que o homem, após breves palavras de enaltecimento ao Exército, assim se expressou:

- coronel, meu pai serviu aqui mesmo, no 13º RI; eu e os nossos quatro filhos mais velhos também servimos neste batalhão; e agora o senhor não quer que nosso caçula sirva à Pátria? O senhor já imaginou o problema que vai criar para minha família?”

Senti que o Cmt Btl estava emocionado. Incentivei-o, perguntando outra vez:

- e então, coronel ?

Respondeu-me ele, com a voz embargada:

- na solenidade de amanhã, o filho daquele senhor estará no grupamento dos novos recrutas do batalhão!

Também emocionado, pensei: esse é o meu Exército!

 

 COLABORANDO PARA A IMPLANTAÇÃO DE TIROS DE GUERRA

Em meados de 1.990, foram criados, pelo Ministro do Exército, os TG de Loanda-PR e de Nova Esperança-PR, para cuja implantação tivemos oportunidade de assessorar o Comando, e também os respectivos Prefeitos, uma vez que estes são os Diretores de tais Órgãos de Formação da Reserva, cabendo ao município o ônus da implantação e do funcionamento, excluídas as atividades militares.

Para apoiar as prefeituras, o saudoso Gen Leonel, Cmt 5ª RM-5ªDE, acatando proposta da SSMR-5, autorizou que a CRO-5 elaborasse o projeto de engenharia dos novos TG. Como resultado, foram entregues às prefeituras o pacote completo de plantas do projeto, que abrangiam as instalações administrativas, sala de instrução, reserva de armamento, sala de estar, cantina, casa para o instrutor e, até mesmo, o mastro da bandeira.

Foi em Loanda que tivemos que cerrar mais apoio. Sugerimos que o prefeito programasse, em local amplo, palestra sobre TG, com nossa participação, e convidasse pessoas da comunidade, principalmente potenciais colaboradores para a necessidade mais premente, ou seja, a execução do projeto das instalações.

A apresentação teve excelentes resultados: além de assimilar a importância e o valor do TG para os jovens conscritos e famílias, e para o município, muitos dos presentes manifestaram vontade de colaborar na aquisição e/ou no fornecimento de materiais de construção.

Para cada TG, que iniciaria com uma Turma de Atiradores, um sargento foi nomeado instrutor e autorizado a residir no respectivo município, desde o início das obras, de forma a ajudar a prefeitura no gerenciamento da obra e a tomar providências concernentes à área militar.

Hoje, passados quase trinta anos desde a criação, os TG 05-016-Nova Esperança-PR e TG 05-017-Loanda-PR já formaram da ordem 2.500 atiradores, os quais, com certeza, vêm conduzindo suas vidas com nobreza de princípios e prestando, cada um, sua colaboração para o desenvolvimento do país.